“Estado mínimo ou Estado de bem-estar social? Controle democrático da política econômica ou liberdade de ação para as empresas transnacionais em um mercado oligopolizado? Estímulo à industrialização do país ou abertura do mercado interno para produtos estrangeiros? Juros altos para beneficiar o setor financeiro ou juros baixos para dinamizar o investimento produtivo, a industrialização, o emprego e o mercado interno? Política tributária regressiva ou distributiva? Controle da evasão fiscal ou leniência com os sonegadores? Aumento do salário mínimo para dinamizar o mercado interno e melhorar a vida dos trabalhadores ou redução do salário mínimo e da cobertura da Seguridade Social para aumentar a competitividade brasileira em relação à concorrência internacional?

Essas questões estão interditadas ao crivo do debate público e democrático. Não interessa a discussão dessas opções sobre o modelo de desenvolvimento brasileiro e quem se beneficia dele. A agenda imposta pelos interesses do sistema financeiro e das grandes corporações busca ocupar o centro do debate político com temas que não questionam sua hegemonia e seus interesses, e atacam o governo e a capacidade reguladora do Estado democrático.

O que ocupa as páginas centrais dos principais jornais do país? A acusação da incapacidade gerencial do governo, a corrupção e o aparelhamento da máquina do Estado por interesses partidários, o “desperdício” de recursos públicos com as políticas sociais, a violência e a criminalidade, o anúncio de uma crise sem fim que prejudica a todos, a criminalização dos protestos e movimentos sociais.

Recentes pesquisas de opinião mostram que a campanha midiática atinge seus objetivos e a agenda das elites ganha a adesão da opinião pública. A mais recente pesquisa Datafolha (nov. 2015) coloca no topo das preocupações da população, pela primeira vez, o tema da corrupção, com 34% dos respondentes considerando o mais grave problema do Brasil; entre os mais ricos, esse índice chega a 49%.

A manufatura do consenso, nos termos de Noam Chomsky, neste caso, é a capacidade de as elites convencerem boa parte da sociedade de que o principal problema do Brasil é a corrupção, e não os altíssimos juros pagos com o serviço da dívida pública. Direcionar a preocupação da população para o tema da corrupção serve para ocultar que pouco menos da metade dos impostos arrecadados pelo governo federal vai para o pagamento dos juros da dívida pública, impondo cortes nos orçamentos da saúde e da educação, entre outros.

Essa habilidade com que as elites e as classes médias altas dominam o que Chomsky chama de “o mercado das ideias” permite a esses estratos sociais influenciarem, ou mesmo moldarem, a percepção da sociedade como um todo sobre a realidade política e limitarem as possibilidades de mudanças políticas e sociais.

Vários importantes analistas políticos, como Jacques Rancière, identificam que o essencial para a construção da hegemonia dos interesses do capital é ter o poder de determinar a agenda. Se a agenda puder ser limitada às ambiguidades (como a má administração), aos abusos e fracassos (como a corrupção), e à violência e criminalidade (entendidas como transgressões), então seus interesses estão preservados e seus opositores, desarmados. Trata-se de interditar o debate, barrar o dissenso e ocultar os fatos indesejados, enquanto se estimula um vivo debate sobre temas que estão no âmbito dos limites permitidos (…)”  

Leia o texto de Silvio Caccia Bava na íntegra no Diplô

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